A vida devia ser como um bailado.
Um palco de luzes ora acesas, ora apagadas, ora em lusco-fusco, e corpos a deslizar pelo chão preto, agarrados uns aos outros, confiantes.
Os movimentos certeiros a imitar qualquer coisa que cada um associa à sua maneira e os mais improvisados, que suscitam sempre formas "efabulativas". Os braços recebem o peso inerte do corpo que parece uma pena. No instante seguinte, empurram-no para longe como se rejeitassem o contacto demasiado próximo. E é neste jogo de vaivém que se desenrola a história, marcada por abraços e empurrões, movimentos suspensos e repetitivos.
*
Ontem li liberdade em cima do palco.
O violino marcou a cadência de cada bater do coração. Meu e dos bailarinos. A música enrolava os corpos, embalava os gestos e rompia as respirações. O Front Line rezava assim, solto e livre, descompensado e desequilibrado. Apenas em harmonia com os instrumentos de cordas. O toque duro do pé contra o tapete negro contrastava com os agudos das violas. Numa espécie de cantiga entrecortada.
Depois veio a Paixão. O Medo.
Dois corpos que se entrelaçavam e surgiam num só, como figuras do mesmo molde. Movimentos aguçados e ternos, violentos e doces, tal e qual a linguagem dos amantes. Primeiro sem música, no silêncio da desconfiança. E depois com ritmo, embalados pela emoção. Dois pesos, um (con)tra o outro, um em face do outro, quentes, pegados - Lento Para Quarteto de Cordas. Uma história de amor como tantas outras, onde coube a paixão arrebatadora, o encanto, a confiança, o medo, o arrependimento, a alegria, o conforto, a idolatria, o sorriso, a solidão, a dor, a felicidade, a alma...
No final, a liberdade em jeito de loucura.
Gestos descoordenados, insanos e descontrolados apoderavam-se dos grupos que mostravam, cada um, a sua visão da história. A Cantata misturava-se com os sons dos corpos a escorregar e a rebolar no chão, a combater a lei da gravidade, a lutar por um lugar no seio da dança. Todos parecem não se importar com a distância que aparentam da normalidade. Todos cambaleiam, a fugir do poço e a precipitarem-se na falésia. Devaneios que nos fazem sentir livres. Até para ser loucos...
É também na dança que vivem os sonhos.
Companhia Nacional de Bailado
Front Line, Henri Oguike
Lento Para Quarteto de Cordas, Vasco Wellenkamp
Cantanta Mauro Bigonzetti
Teatro Camões
sexta-feira, 4 de abril de 2008
Palmas.
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