segunda-feira, 11 de abril de 2011

O Re-Encontro.

Quando olhei de relance, não o reconheci. Estava de máquina fotográfica ao peito e mantia a mesma postura alinhada de antes. Os anos teriam passado por ele certamente, mas o olhar dizia-me bem mais que a incerteza. O sorriso era discreto, mas a firmeza dos passos transmitia, de longe, sucesso e preserverança. Rapidamente as memórias se transformaram em imagens claras e dei comigo sentada na sala de espera do Consultório do Dr. O. Os sofás, castanhos e de canto, aturavam-me tardes inteiras, bem como a recepcionista, a quem perguntava de 5 em 5 minutos se "ainda faltava muito?". Recordo-me do caminho para Coimbra e das noites mal dormidas, enquanto sonhava que ia ao pediatra. Talvez tenham existido vezes em que inventei um espirro ou uma dor de garganta para poder ir até lá. Já sabia que ao entrar me tinha de descalçar e saltar para a maca - "Upa!". Ao redor imagens de crianças e bonecada faziam as minhas delícias. O pai e a mãe, e depois a mana, sabiam que ia ser difícil arrancar-me dali. Não me lembro de como foi o último adeus. Nem com que idade. Sei que lhe escrevi cartas e postais, re-inventando os anos e, teimando, que os anos não passassem. Natal, Páscoa e "porque sim's" eram suficientes para passar para o papel o dia-a-dia de uma "adolescente que já não tem idade para ir ao pediatra".
Com o tempo, desvaneceu-se a escrita, mas não as saudades. Ainda consegui aproveitar alguns dos ensinamentos e palavras sábias, durante as consultas da mana. Mas talvez tenham passado 10 anos, desde a última consulta.

No Sábado, voltei a encontrá-lo. O nome estava na lista de presenças e o receio de que ele não viesse fez com que perguntasse à organização se tinha mesma a certeza que ele viria - "sim, sim". E sim, re-encontrámo-nos. Ele lembrava-se do meu nome e, quando sorriu, foi como que um concretizar de um sonho. Tantas foram as vezes que perguntei por ele, pensei em telefonar ou até mesmo escrever. O receio de parecer "careta" foi mais forte. Como dizem alguns - "Ninguém se lembra do pediatra!".

Pois eu lembrava-me do nome, do bigode, da cor, do olhar e da voz. Ouso até dizer que talvez o perfume é o mesmo. Ficaram tantas e tantas coisas por perguntar. Que agora tenho a certeza que o receio patético já não vai permitir deixar fugir a memória. Já trocámos endereços de e-mail e já o adicionei no FB. Assim vou poder perguntar-lhe como tem sido a vida para além do consultório e tentar, um dia, visitá-lo em Coimbra.

Toda a gente sabe que tenho três desejos desde a idade "pediátrica" - tocar bateria (já fiz aulas de percussão); fazer um piercing (hoje já fechou) e ter uma mota (talvez depois dos 30, quando tiver uma casa com garagem). Bem, hoje tenho a certeza afinal eram quatro. Todos estes e mais um: re-encontrar o Dr. O. Porque a alegria foi tão imensa que só pode ter sido o concretizar de um sonho de infância. Obrigada Dr. O.

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